Abandone o teu próximo como a ti mesmo

Abandone o teu próximo como a ti mesmo

Próximo ou Outro

Próximo ou Outro

De Amar o Próximo a Amar o Outro: O Amor que Nos Transforma

Introdução

Enquanto seguimos a caminhada da fé, algumas pequenas pedras aparecem no caminho.
Hoje, quero refletir com você sobre uma delas: o entendimento do amor ao próximo.
Uma pedra que parecia pequena, mas que, com o tempo, se tornou um tropeço para muitos.

1. O limite do amor ao próximo

No Velho Testamento, Deus ensinou que o amor deveria começar pelo próximo — aquele que partilhava da mesma fé, da mesma história, da mesma promessa.

“Não procurem vingança, nem guardem rancor contra alguém do seu povo, mas amem cada um o seu próximo como a si mesmo.”   

Paulo, ao resumir a Lei, reforça essa mesma linha:

“Pois toda a Lei se cumpre num só mandamento: ‘Ame o seu próximo como a si mesmo.'” 

Mas esse amor tinha um limite silencioso: o próprio eu era a medida.

Amar como amo a mim mesmo.
Mas… e se eu não souber me amar de forma verdadeira?
E se o meu amor for confuso, imperfeito, falho?

Paulo, cheio do Espírito, confessa:

“Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal que não quero fazer, esse eu continuo fazendo.” 

Se nem a mim mesmo consigo fazer o bem que desejo,
como posso ser eu a referência segura para amar o outro?

2. A mudança radical trazida por Cristo

Jesus não veio apenas repetir a antiga orientação.
Ele veio cumpri-la e, ao cumpri-la, ultrapassá-la.
Ele não nos mandou amar o próximo como a nós mesmos.
Ele nos mandou amar como Ele nos amou.

“O meu mandamento é este: amem-se uns aos outros como eu os amei.” 

Aqui, a referência muda completamente.
O eixo do amor não está mais em nós.
Está em Cristo.

O amor verdadeiro não nasce do nosso esforço.
Não nasce da nossa compaixão natural.
Não nasce do nosso desejo de ser bons.

Nasce Dele.
Nasce de Cristo sendo formado em nós.

Cristo é o outro em nós —
o novo homem que ama sem interesse, sem medida, sem cálculo.

3. A bondade que conduz à transformação

Em Cristo, aprendemos a amar de um jeito que não é mais natural:
perdoando quem nos fere, amando quem nem sabe o que faz e servindo quem não merece.

“Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo.” 

Paulo nos lembra:

“Ou será que você despreza as riquezas da sua bondade, tolerância e paciência, não reconhecendo que a bondade de Deus o leva ao arrependimento?” 

O amor verdadeiro é obra da graça.
Não é apenas tolerância.
Não é apenas caridade.
É vida sendo formada no espírito.

“Jesus declarou: Digo-lhe a verdade: Ninguém pode ver o Reino de Deus, se não nascer de novo.” 

Ver o Reino é reconhecer sua beleza.
Mas entrar no Reino é outra coisa:
É participar da vida que Cristo oferece.

“Digo-lhe a verdade: Ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água e do Espírito.”   

É pela formação de Cristo em nós que deixamos de apenas admirar o amor de longe — e passamos a viver esse amor por dentro.

4. A sutil inversão da tradição

Com o passar dos séculos, no entanto, algo foi se perdendo.
Influências humanas, mesmo bem-intencionadas, começaram a ressurgir:
a ideia de que o ser humano é naturalmente bom, bastando apenas ser educado ou estimulado a praticar o bem.

Essa visão — tão parecida com o pensamento moderno, que romantiza o homem natural — penetrou também no meio cristão.

Assim, o amor ao próximo foi reduzido, muitas vezes, a uma prática de obras sociais, de ajuda ao necessitado, de bondade visível.
Tudo nobre.
Mas ainda assim, tudo aquém do que Cristo revelou.

O Evangelho não nasce da bondade humana.
Nasce da formação de Cristo em nós.
Sem Ele, nossas boas obras não passam de tentativas frágeis de repetir, com esforço humano, o que só pode ser gerado pelo Espírito.

“Em verdade te digo que ninguém pode ver o Reino de Deus, se não nascer de novo…
e ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água e do Espírito.”
 → 

Não se trata apenas de ajudar o outro.

Trata-se de ser transformado para que Cristo ame através de nós.

Conclusão

Amar o próximo como a si mesmo era o resumo da Lei.
Amar o outro como Cristo nos amou é o início da vida nova.

Cristo é o outro em nós.
O novo homem que sabe perdoar, amar como Ele amou e servir até o fim .

E cada passo nessa direção — ainda que pequeno — é uma pedra a menos no caminho.
É mais luz na estrada.
E mais liberdade para caminhar.

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Sem Vergonha: O novo homem que não se esconde O choque mínimo necessário Há palavras que nos incomodam de propósito. Não porque são agressivas, mas porque nos chamam de volta à verdade. Ser sem vergonha é uma delas. A tradição nos ensinou a nos esconder. A baixar os olhos. A andar como se ainda fôssemos Adão. Mas a cruz não nos chama ao esconderijo — ela nos chama à luz. Cristo em nós é o fim da vergonha. E viver sem vergonha é o mínimo necessário para quem foi feito filho. 1. A vergonha é o que trava a nova criação O primeiro fruto do pecado não foi a maldade — foi a vergonha. “Tive medo, porque estava nu, e me escondi.” Adão perdeu a glória e, ao perceber, se escondeu. E a partir dali, a humanidade passou a viver escondida de Deus e dos outros. Essa vergonha se torna um sistema. Ela veste o homem com folhas. Com rituais. Com boas obras. Com falsa humildade. Mas o medo continua lá. Porque a vergonha é o cárcere da nova criação. 2. O novo homem não se envergonha da luz Jesus veio sem vergonha. Sem medo de ser chamado de filho. Sem medo de dizer: “Eu sou.” Sem medo de viver cheio da glória do Pai — mesmo num mundo que só conhecia sombras. “Eu sou a luz do mundo.” “Quem me vê, vê o Pai.” “Eu sou o pão, o caminho, a ressurreição.” Essas frases não são títulos — são identidade revelada. E Ele diz aos discípulos: “Vocês são a luz do mundo.” O que é isso, senão a transferência do “Eu Sou” para dentro de nós? Uma nova identidade que não cabe mais na vergonha de Adão. 3. Jesus disse: “Se vocês não crerem que Eu Sou...” “Se vocês não crerem que Eu Sou, morrerão em seus pecados.” Ele não disse: “Se vocês não crerem no que eu faço.” Nem: “Se vocês não crerem no que eu ensino.” Mas sim: “Se vocês não crerem que Eu Sou...” Ou seja: Se vocês não crerem quem Eu sou — não conhecerão quem vocês são. Porque crer que Ele é, é o único caminho para descobrir que nós também somos — filhos, luz, parte do Corpo. E se nós não crermos que somos...? Então morreremos também. Não mais no sentido de perdição eterna, mas na experiência de não viver o novo homem, de não manifestar o Cristo em nós. O “Eu Sou” dEle nos chamou. O “Eu Sou” em nós nos levanta. 4. Ide... e vejam que Eu estou com vocês A tradição nos ensinou: “Ide por todo o mundo, e eis que estou convosco.” Mas a linguagem do Espírito diz: “Ide... e vejam que Eu estou com vocês.” Não é uma presença apenas prometida, mas real, atual, viva. O “Eu Sou” vai conosco. O “Eu Sou” habita em nós. Por isso, não basta ir. É preciso crer — e ver. Crer que Ele é, e ver que nós somos com Ele. 5. O escândalo da graça: ser sem vergonha A tradição diz: “Não se ache.” A cruz diz: “Ache-se em Cristo.” A religião diz: “Não diga ‘eu sou’.” O Espírito diz: “Diga sim — Cristo vive em mim.” Não se trata de arrogância. É reconhecer que a velha natureza morreu, e que o novo homem já não tem do que se envergonhar. Viver escondido, chamando isso de reverência, é o mesmo que negar a eficácia da cruz. Conclusão “Negar que Cristo vive em mim é negar a cruz.” “Negar que sou filho é envergonhar o Pai.” Por isso, ser sem vergonha é o começo da glória. E quem anda na luz, não anda disfarçado. Sem vergonha de Ser