Eu continuo não entendendo
Tenho vivido algo que se repete.
Conversas com pessoas honestas. Queridas. Experientes.
Gente de caminhada longa, que ama a Deus, que estudou, que serviu.
Falo com carinho, com cuidado, com palavras simples —
mas é como se a mensagem batesse numa parede invisível.
Falo sobre a cruz de Cristo.
E ouço, com frequência dolorosa:
“Eu continuo não entendendo.”
Não estou falando da cruz de Jesus.
Essa, todos conhecem.
A cruz da salvação. Do sangue derramado. Do perdão conquistado.
Ela é cantada, celebrada, reproduzida em mil formas.
Mas o que quase ninguém vê —
nem mesmo os que se dizem maduros —
é a cruz que também está em nós.
A cruz da qual Jesus falou antes mesmo de ser crucificado.
“Quem não toma a sua cruz e não me segue, não é digno de mim.” →
Essa é a cruz que não emociona.
Não tem pregação bonita.
Não tem música de fundo.
É a cruz do esvaziamento.
É onde não apenas Jesus morreu por nós,
mas onde nós morremos com Ele.
E é essa cruz que eu procuro compartilhar.
Com zelo. Com reverência. Com temor e amor.
Mas quase sempre, a resposta vem com sinceridade e olhos ainda velados:
“Eu continuo não entendendo.”
E eu compreendo.
Porque essa dor de quem ainda não vê…
tem nome nas Escrituras:
“Meus filhinhos, por quem de novo estou sofrendo dores de parto, até que Cristo seja formado em vocês.” →
Esses dias, em uma conversa serena com uma amiga querida — uma mulher inteligente, sensível, com anos de caminhada — perguntei com carinho:
— Se você disser para os seus amigos, colegas, conhecidos, que o Espírito Santo está sobre você… o que eles dirão?
Ela parou. Pensou. E sorriu.
E respondeu com sinceridade, meio rindo, meio constrangida:
— Vão dizer que eu estou me achando muito…
Ela sabia do que eu estava falando.
E naquele sorriso havia algo bonito e triste ao mesmo tempo:
a consciência de que temos vergonha de dizer o que o próprio Cristo conquistou para nós.
Não por incredulidade.
Mas para não parecermos pretensiosos… diante da tradição que nos moldou.
E talvez por isso Jesus tenha dito:
“Se alguém se envergonhar de mim e das minhas palavras, o Filho do Homem se envergonhará dele…” →
Não é vergonha de Jesus, o homem histórico.
É vergonha de Cristo — sendo formado em nós.
E, por causa dela, continuamos calados.
Com medo.
Com véus.
Durante anos, eu também não vi.
Mas um dia, o Espírito abriu meus olhos — e mostrou a cruz onde eu mesmo estava pregado.
E isso virou um testemunho vivo, que compartilhei aqui, neste blog, no artigo: Linguagem com autoridade e Poder →
Mais adiante, uma nova imagem: uma mulher crucificada: A cruz em nós →
E mais uma vez, percebi o quanto ainda estamos presos à ideia de que a cruz é só de Jesus,
sem perceber que Cristo também está sendo formado em cada um de nós.
Homens e mulheres. Jovens e velhos.
O Espírito foi derramado sobre todos.
Mas ainda há fortalezas.
“As armas com as quais lutamos não são humanas; ao contrário, são poderosas em Deus para destruir fortalezas. Destruímos argumentos e toda pretensão que se levanta contra o conhecimento de Deus…” →
Cristo em nós não é uma doutrina.
É um mistério.
E a cruz é a porta.
“Fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim.” →
Quando Paulo diz que prega “Cristo, e este crucificado”,
ele não está olhando apenas para Jesus pendurado num madeiro.
Ele está olhando para o processo invisível e contínuo que opera em cada um que crê:
Cristo sendo formado.
O velho homem sendo crucificado.
O novo homem surgindo da dor.
Talvez por isso quase ninguém entenda.
Porque isso não se explica — se revela.
Mas uma coisa eu sei:
o Espírito Santo está derrubando essas fortalezas.
Ele está abrindo os olhos.
Ele não desiste.
E quando essa revelação acontece, tudo muda.
A frase deixa de ser:
“Eu continuo não entendendo.”
E se transforma em:
“Agora eu vejo.”
E depois de ver…
vem o convite para entrar.
Como disse Jesus a Nicodemos:
“Em verdade te digo que ninguém pode ver o Reino de Deus, se não nascer de novo…
e ninguém pode entrar no Reino de Deus, se não nascer da água e do Espírito.” →
Primeiro se vê. Depois se entra.
E tudo começa quando o véu cai…
e a cruz que parecia distante, agora pulsa dentro de nós.